Anjack - Roteiro para Filme 3D

SINOPSE
Roteiro para filme em 3D, sobre seres alados e
homens em Marte, a 50.000 anos. Guerra,
romance, vinda para a Terra. Lenda dos
anjos e demônios.
ANJACK
INTRODUÇÃO
INTERIOR DE CAVERNA - ESCURO TOTAL
Tela completamente escura. Som baixo e grave. Sem aviso, um buraco pequeno se abre com violência, com barulho metálico, jogando pedaços de pedra e poeira. Uma ponta de metal aparece no buraco aberto. Espera um segundo. Move-se e é retirada de forma decisiva. Facho de luz penetra no buraco aberto. Som grave aumenta uma escala. Um segundo de espera. Novo golpe metálico, as pedras se movem. Outro e outro, o som vai subindo na escala. Pedras grandes caem, a luz penetra entre a poeira. Golpes de metal sobre pedra, de duas picaretas. O buraco se abre mais, barulho de rochas rolando e respiração ofegante, sombras interrompendo a luz. Uma grande porção de rocha cai, abrindo quase toda uma janela. As picaretas param. Silêncio. Barulho de movimento de pessoas. Mãos enluvadas nervosas penetram na janela, arrancam pedras, puxando-as para si, empurrando-as, até abrir quase uma pequena porta. A luz penetra com dificuldade pelo ambiente escuro e empoeirado. Câmera parada, aguardando. Um corpo obstrui a luz. Câmera em detalhe na roupa grossa, luvas para trabalho pesado. Um braço se levanta suspendendo um lampião acima da cabeça. A luz revela aos poucos uma caverna. Um pequeno compartimento bem escavado, com cantos retos e chão plano. Ao iluminar um vulto, vacila.
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Sentada numa pedra, recostada na parede, uma forma humana. Um esqueleto completo, ainda vestido com trapos e com peitoral de couro. O homem se aproxima, o lampião treme. Câmera percorre os pés calçados de sandálias, os ossos das pernas, trapos cobrindo o corpo. Fivelas metálicas. Tiras de couro. O queixo está apoiado no peito, mantendo o rosto bem abaixado e cabelos trançados caindo para frente. Acima do ombro, aparece o punho de uma espada. Outras formas apenas sugerindo asas surgem. A luz ilumina uma depressão na parede logo acima. Levanta mais o lampião. Ilumina em cheio o baixo relevo bem marcado, gravado fundo na rocha.
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Câmera se afasta rápido, focada no ambiente - TRAV. - que vai deixando para trás. Sai da sala, se afasta por um longo túnel escavado na rocha, bem iluminado por lâmpadas em toda sua extensão, a câmera sobe pelo fosso de um elevador simples. Sai e continua subindo, revelando um plano geral. Próxima a um penhasco íngreme e enorme, em meio a enormes lascas de pedra. Próxima de uma geleira que está se derretendo, formando um rio cristalino e rápido, com muitos veios de água em torno. A entrada da caverna, cercada de containeres e barracas, grandes tratores, caminhões e muitos homens agitados em torno de uma grande barraca de plástico branco. Um helicóptero cruza ruidosamente a cena. O vento levanta uma das pontas da grande barraca, revelando à câmera o detalhe de uma negra forma metálica corroída. Câmera sobe rápido, até o espaço, o planeta se tornando um ponto azul.
Nasce Anjack
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INT. ESCURO ANFITEATRO EM MARTE - DIA
Ponto azul com Saturno em primeiro plano. Câmera abre para dois planetas bem semelhantes em perspectiva, ambos azuis, girando pacificamente no espaço. A ponta de uma enorme asa atravessa a cena. Sobe o murmúrio de muitas vozes. Uma voz se eleva, autoritária. Plano geral de um anfiteatro cheio de anjos e homens jovens. Pouca luz no ambiente, um holograma no palco central mostrando o sistema solar em movimento. Câmera segue a órbita de um planeta azul. Quando se aproxima do anjo em pé no palco, fica nele. Um anjo adulto jovem, Jon, professor.
JON
Se todos os planetas de nosso sistema são irmãos. Gea é nosso irmão gêmeo. Nascido do mesmo útero, da mesma semente e apenas alguns segundos do tempo cósmico depois do nosso planeta.
ALUNO
Má sorte, Gea.
A atenção de Jon é atraída pela observação inoportuna do aluno. Volta-se para ele, pronto para censurá-lo. Mas o aluno está sério, respiram. Aponta o Cinturão de Asteróides, onde muitas rochas pairam, em muito maior número do que atualmente.
JON
De tempos em tempos, o movimento desordenado dos asteróides dessa região lança para o espaço rochas enormes. Algumas delas, tomam rumos fatais.
Enquanto expõe, o holograma ilustra. Algumas rochas chocando-se e tomando rumos aleatórios para longe do Cinturão. Uma delas, bem maior do que as outras, choca-se violentamente com outra, parte-se em muitos pedaços, sendo lançada para uma nova rota.
JON
Este grupo de rochas ruma de encontro a Gea.
No holograma, de forma didática, o grupo de rochas se desloca em uma larga elipse, deixando uma linha vermelha atrás de si, ao mesmo tempo em que uma linha azul se forma no rastro do planeta azul. A tangente onde se encontram é evidente. Enquanto Jon fala, o holograma aproxima o plano, mostrando os asteróides se aproximando do planeta.
JON
Dentro de algumas horas, terão atingido um de seus maiores continentes.
No holograma, os asteróides atingem o planeta. Penetram a atmosfera criando um rastro de fogo, fumaça e poeira. Um círculo escuro se abre na superfície, cresce devagar, espalhando-se, envolvendo todo o planeta. Até que quase desaparece contra a escuridão do espaço. Jon continua com voz grave e emocionada, acima dos murmúrios de lamentos dos alunos.
JON
Sabemos que é cheio de vida vegetal e animal, pois é muito parecido com o nosso próprio mundo, há centenas de milhares de anos. A atmosfera é mais densa, o clima é de extremos, mas dentro dos limites tolerados pelas formas de vida. Contém vastas porções de terra e água em estado líquido. Muita vida primitiva e, muito provavelmente, alguma forma de vida inteligente em evolução. Agora, o choque vai destruir imediatamente um décimo da superfície, todo o resto permanecerá encoberto pela poeira durante anos, trazendo a escuridão e o frio.
Rostos tristes comentam, perguntam.
JON
Mas a vida resiste! A vida vegetal vai renascer quando o sol voltar. Em cavernas profundas, no fundo dos oceanos, formas simples e resistentes vão sobreviver e a evolução vai recomeçar.
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Luzes se acendem, o holograma desaparece. Os alunos começam a se levantar. Painéis se abrem no teto. Anjos voam por eles. Homens saem pelas portas. Dois anjos carregam uma humana pelo ar, rindo. Anjos e homens saem andando, conversando. Jon guarda livros em sua bolsa. Usa túnica leve, com um peitoral com seu símbolo. Outros anjos têm símbolos próprios. Jon voa pelo painel próximo. Seu vôo é vigoroso, a expressão preocupada sumindo do seu rosto à medida que faz força para subir, até assustando professores mais velhos e alunos indolentes em seu caminho.
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Abaixo, muitos anfiteatros de onde saem alunos. Pequenos domos cercando um grande domo central mais movimentado. Deixa os limites da escola. Cruza com muitos anjos e veículos aéreos de aparência leve e colorida que seguem em todas as direções e altitudes, deslizando silenciosamente no ar. Há grandes balões, dirigíveis e pequenos veleiros aéreos. O dia é claro, com algumas nuvens enormes. Quando se aproxima delas, vê que são cultivadas com ordenadas parreiras de uvas, outra com longas filas de árvores frutíferas, outra completamente cultivada com trigo e todas cuidadas por anjos. Um deles acena e Jon retribui.
Jon voa para baixo, sobre casas espaçadamente dispostas no campo, por onde circulam homens. Sem aviso, mergulha por um cânion enorme. Nas altas paredes, muitas sacadas bem decoradas por detalhes arquitetônicos e alegremente pintadas, cercadas por trepadeiras floridas, por onde circulam anjos. Jon segue o curso de um rio no fundo do cânion, sobe por uma cachoeira, seguindo o rio entre árvores imensas, com casas construídas entre os galhos. Sobe, cruzando com um rebanho de enormes pássaros, apascentado por humanos que cavalgam pássaros bem encilhados. No chão, homens e anjos convivendo. Mães das duas raças cuidam juntas de seus filhos, crianças aprendem a voar, estimuladas por crianças humanas.
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Soldados anjos vigiam o horizonte. Homens em balões de observação, com armas preparadas. Soldados em largas estruturas circundadas por colchões de gás e enormes painéis solares. Apreensão e tensão no rosto de todos.
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Nas encostas de uma cratera antiga circundada por colinas suaves de um lado e por uma parede lisa de outro, por onde desce uma cachoeira formando um rio tranqüilo que atravessa o vale, uma comunidade de casas de anjos e homens. Jon segue na direção da cachoeira, para uma das sacadas mais próximas. Uma mulher acena da entrada da casa, apoiada no parapeito. Ao seu lado um pequeno vulto alado, mistura de primata e pássaro, olha para a direção de Jon, nervosa por não poder ver. A mulher voa. Encontra Jon no ar. Abraçados, giram no ar, dançando. Ele aponta para baixo. Voam nessa direção. Chegam num mirante, uma praça no alto da cachoeira. Uma grande cadeia de montanhas escuras ao longe. Muitos passeiam por ali. Beijam-se e ela afaga o rosto dele.
MÃE
Saudades, meu amor.
JON
Ficar todo tempo com você, é só o que me faz feliz.
MÃE
Vai voltar?
JON
Volto ao observatório mais tarde.
MÃE
A colisão será horrível.
JON
Vai fazer todos pensarem melhor.
MÃE
Aconteceu mais alguma coisa?
JON
Só agora decidiram mandar uma expedição a Gea. Não antes, quando tanta vida podia ser preservada.
MÃE
Talvez nosso filho possa ir, algum dia.
Afaga a barriga, pensativa. Ao fundo, soldados passam apressados, olhando para o céu.
MÃE
Está triste, por Gea?
JON
Meu trabalho é aprender sobre as estrelas e planetas, para poder ensinar.
MÃE
Só quero um mundo melhor para nosso filho.
Os soldados estão agitados, ao fundo. Um deles ouve um rádio, aponta o céu. O outro fala no seu rádio e grita.
SOLDADO
Alarme!
Jon e a Mãe olham para o céu. Vindo da cadeia de montanhas, aproximam-se o que parece nuvens densas e negras. Aproxima-se depressa, definindo-se como muitos veículos aéreos e seres voadores. Os veículos deixam fumaça escura à sua passagem. Barulho de motores a jato. Primeiras explosões no céu e no chão, cada vez mais perto. Barulho de motores em crescendo. Flashes de canhões disparados das fuselagens escuras.
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Explosão perto de Jon, na área do mirante. As pessoas correm aos gritos de alerta. Mães apanham seus filhos menores, protegendo-os. Um anjo adolescente carrega uma criança humana para longe.O céu escurece com a aproximação dos atacantes. Tiros, rajadas e explosões generalizadas. Jon protege a Mãe com um braço, voando juntos para a casa, logo abaixo deles. Pousam na sacada e entram. Joga a bolsa de livros no chão, pega um peitoral grosso e pesado e veste nela. Instala uma arma no braço, encaixada no punho. Ela também. Ele vai para a porta, ela começa a segui-lo. Ele volta e impede.
JON
Fique no abrigo e se proteja.
Ela concorda, olhando a barriga. Ele voa para o ar cortado por tiros. Ela se entrincheira no parapeito da sacada e atira. Gaia, o voador doméstico, se agarra a ela, apavorada.
MÃE
Vá para dentro, Gaia.
Humanóides com pele e traços reptílicos, escuros, asas membranosas com esporões brilhantes, cauda longa, pernas curtas, tronco forte, vestindo armadura negra quase sem nenhum padrão entre si, atiram ferozmente, segurando armas de fogo longas com ambas as mãos, seja em soldados ou nas pessoas desprotegidas. Atiram em veículos civis, animais, para dentro das casas, destruindo árvores, plantações e tudo o que encontram pelo caminho, sem nenhum critério.
Anjos armados saem de suas casas, atirando. Balões são atingidos e se rompem sem explodir. Primeiras baixas entre os atacantes. Soldados anjos e homens, machos e fêmeas em igual proporção, agrupam-se e se alinham para defesa, respondendo ao ataque de forma organizada e silenciosa. Pesados veículos aéreos daemons atiram sem cessar contra tudo.
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Baterias antiaéreas, no alto dos postos de observação, atiram nas naves voadoras. Surgem pesados e barulhentos helicópteros daemons, de onde saem nuvens de guerreiros. Jon tenta se aproximar de um grupo de soldados anjos, sendo impedido por um grupo de daemons em seu caminho. A Mãe tenta sair da sacada, mas muitos tiros atingem a parede da casa e o parapeito da sacada. Ela recua, atirando. No ar, uma explosão perto de Jon, ele corrige o vôo, atirando contra um grupo de daemons. Soldados anjos alinham-se a Jon, atirando em cadência e dispersando os daemons. De ambos os lados, muitas baixas. Tanque voador atiram contra o grupo de Jon. Explosão muito perto. Ela grita e voa. Jon está aturdido, caindo sem controle. Três daemons seguem sua queda. Ela segue atrás deles. Os daemons atiram em Jon, divertidos com a situação. Ela atira e acerta um dos daemons, que cai. O outro olha para trás, volta-se, rosna e sobe na direção dela, atirando. Jon se recupera pouco antes de chegar ao o chão, atingindo o solo com força. O daemon mergulha com ambos os pés em suas costas. Ele cai, rola e se ajoelha, sentindo o choque. O daemon anda para ele com a arma apontada, rindo, os esporões chicoteando o ar. De repente, paralisa-se e cai para frente. Atrás dele, a Mãe, com sua arma de punha ainda erguida. Dois homens soldados correm para eles, atirando para o alto em todas as direções. Um soldado ajuda Jon a se levantar, ela se aproxima. O soldado aponta para cima.
SOLDADO
Vão para o abrigo.
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Os dois, seguidos por Gaia, voam rente à escarpa lisa do vale, esquivando-se dos tiros e explosões. Entram num posto militar encravado na rocha. Está sob intenso ataque, respondendo com baterias e soldados atirando. Exaustos, abrigam-se num canto. Ela aperta a barriga, sentindo dores.
MÃE
O bebê quer nascer justo agora.
Ele a ampara. Lá fora, aproximam-se tanques voadores e muitos daemons atacando o posto. Os soldados resistem. Um corre para eles e aponta um veículo blindado.
SOLDADO
Vão para aquele blindado, vamos retirar.
Entram nele. Já está cheio de outros civis. Arrancam e voam para fora. Atrás deles o posto e destruído pelo fogo cruzado de tanques daemons. Helicópteros daemons passam a perseguir o veículo, sempre atirando. Voam sacudidos por explosões. Ela se ajoelha, apertando a barriga. Jon abre espaço no chão e ajuda a se deitar. Uma mulher o afasta e assume. Jon levanta, pega uma arma pesada e atira pela porta aberta do veículo, olhando às vezes para o grupo em torno da Mãe. Ouve seu grito. Volta a atirar com determinação, até a arma esvaziar. Volta para ela. Está desfalecida. Uma mulher segura um bebê envolto na própria túnica que usava. Jon o agarra. A nave é fortemente atingida. Jon abraça o bebê e são jogados longe pela explosão. Estabiliza o vôo, vendo o veículo cair, partido ao meio, em fogo e explosões. Daemons o localizam. Ele voa, agarrando o bebê com um braço e atirando com o outro. Um daemon surge em meio à fumaça, chocando-se violentamente com Jon. Desequilibrado, o bebê escapa de sua mão e cai. Jon mergulha em sua direção, vendo-o cair em meio a nuvens negras de fumaça. Jon mergulha em sua direção. Grita em desespero.
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Enquanto arremete à procura do bebê que cai, passa pela túnica que o envolvia. Entrevê o bebê, com as pequenas asas ainda coladas ao corpo, sumindo numa nuvem negra. Jon procura. O chão surge de repente. Freia o vôo, pisando o solo com força. Procura entre pedras, destroços fumegantes e fumaça. O sangue escorre por um corte profundo entre a orelha e a boca. Tiros e gritos de batalha. Nada encontra. Uma trombeta soa, outra vez mais perto. Desesperado, leva as mãos ao rosto e cai de joelhos, com as longas asas escorridas até o chão. Trombeta bem perto, colunas de anjos e veículos passam acima dele, avançando contra os daemons. Ouve asas batendo. Levanta os olhos. O bebê voa na sua frente, com muito esforço, mas ileso. Jon se levanta e o abraça, chorando e rindo, Acima dele, longas colunas de anjos e homens atacam os daemons, que fogem em direção às montanhas.
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Plano de campos incendiados, naves caídas fumegando, casas destruídas, feridos e mortos por todos os lados, desolação. A noite vem chegando. Jon caminha com o bebê nos braços, em choque, procurando entre os feridos e mortos. Gaia chega, perdida e chorando, abraça as pernas de Jon. Jon compreende ter perdido a Mãe. Jon se ajoelha e mostra o bebê.
JON
Esse é Anjack.
A voadora toca o rosto do bebê, tímida, com carinho. Balbucia o nome. Jon olha para o céu, por uma abertura na fumaça que revela as estrelas, centrando um ponto azulado. Neste momento, os primeiros asteróides chocam-se com Gea, que vai se tornando opaca, uma bola escura no céu.
III - Anjack e Mary
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Uma bola voa no ar. Ouve-se o grito de Gaia, com voz infantil.
GAIA
Anjack!
A pequena voadora, mais envelhecida, grita e gesticula para o céu, no meio de outras pessoas que a observam divertidas. Anjack no ar, agarra a bola. É um campo de jogo. Dois times com uniformes coloridos, formados de anjos e homens. O campo é dividido e três partes. No meio, uma parte descoberta. As duas extremidades cobertas por uma rede a um metro da cabeça dos jogadores. Nas pontas os gols. Anjack voa de encontro ao centro do campo. Anjos da outra equipe, tentam interceptar seu vôo e roubar a bola, Ele se contorce com movimentos sutis das pontas das asas e escapa deles. A centímetros do chão, roçando a grama curta com o peito, se contorce e nivela, penetrando por baixo da rede, onde não pode bater as asas. Os de seu time, homens, abrem caminho, bloqueando os do outro time. Anjack abre as asas, endireita o corpo, os pés tocam o chão, corre. É cercado. Foge para o lado, acuado. Joga a bola para um companheiro. Ele corre para o gol. Há dois enormes zagueiros no seu caminho. Anjack corre ao seu lado. Grita. Recebe a bola de volta, os zagueiros vem em sua direção. Devolve a bola. Enquanto os zagueiros o derrubam, vê o companheiro penetrar na linha do gol. Um apito. Anjack se levanta, festejando. Outros o cercam gritando. O juiz acaba o jogo.
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O time de Anjack festeja, saindo do campo. Gaia voa até ele, quase o derrubando com um abraço.
GAIA
Anjack mau. Pode se machucar. Gaia não gosta.
O companheiro do gol chega, muito cumprimentado pelos outros. Tira o boné e solta longos cabelos. Rindo sem parar de andar na direção deles.
MARY
Derrubado por Gaia, Anjack?
ANJACK
Ainda bem que ela não joga no outro time.
A moça passa por ele, voltando-se um pouco para chamar.
MARY
Vamos para a festa no parque.
Plano de Anjack e Gaia seguindo Mary. Plano geral em volta do campo. Muitas barracas leves e coloridas, grandes brinquedos. Homens, anjos e outras voadoras semelhantes a Gaia circulam. Entram e saem de barracas, comendo, bebendo. O céu está cheio de balões coloridos e anjos. Um grupo passa e por Anjack e chama por ele.
ANJACK
Podem ir sem mim.
Um deles, homem, fica com Anjack. Logo alcançam Mary.
ANJACK
Mary, espere, aonde vai?
Ela só aponta para frente, sem parar.
MARY
Soube de um contador de estórias que veio de longe.
ANJACK
De muito longe. É Kronos, o maior de todos. Dizem que é capaz de despertar imagens perfeitas na mente de quem ouve, só com o poder da voz.
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Andam entre a multidão alegre e barulhenta, até uma tenda maior, decorada por antigas cenas épicas pintadas em estilo quase pré-histórico. Dentro dela, um anfiteatro em semicírculo, com uma concha natural enorme tomando todo o palco. Há apenas um ser no centro acústico. Tem porte de anjo, mas não tem asas. É muito velho, apesar de sua aparência inspirar força. Magro e de olhos brilhantes. Tem os longos cabelos brancos trançados e decorados por pequenas conchas, pedras semipreciosas, pequenos entalhes de madeira, penas coloridas, jóias de metal e uma infinidade de outros detalhes. O teatro está cheio de anjos e homens. As crianças são estimuladas a sentar nas primeiras filas, bem próximas do contador, apesar do temor ou respeito que ele lhes inspira. Mary cochicha a Anjack.
MARY
Dizem que arrancou as próprias asas, quando perdeu a mulher que amava. Desde então, descobriu o dom de inspirar imagens na mente dos outros.
Sob a túnica de Kronos, os tocos das asas. Pedidos de silêncio. A platéia se aquieta aos poucos até o silêncio ficar completo, restando apenas o murmúrio abafado e distante da festa lá fora. Com a voz quase cantada, baixa e suave, Kronos começa. Suas palavras produzem imagens completas e iguais para todos aqueles que prestam atenção. Tanto, que seu relato deixa de ser ouvido conscientemente e permanece o desenrolar da ação descrita, com todos os detalhes. De pessoa para pessoa, pode haver mínima variação em algum detalhe mais pequeno, o que não interfere no desenrolar da estória.
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INT. CLARO - DIA
KRONOS
"Alis ainda era um menino, mas a grande ilha onde nasceu já era pequena demais para seu espírito de aventura. Não havia uma só árvore que não houvesse sido trepada, nem caverna que não tivesse explorado, nem criatura que não houvesse conhecido".
As imagens vão dando lugar às palavras de Kronos, mostrando Alis saltando de um galho alto, tateando numa caverna cheia de morcegos e correndo junto a uma manada de cabritos até o pico de uma montanha rochosa.
KRONOS
"Então, por quê não se lembrava daquele vale? Anda por uma garganta estreita e sai num vale de cercado de paredões íngremes e picos agudos, é um vale verdejante, repleto de vozes de pássaros e animais. Desce pela encosta até dar num córrego e encontrar um pequeno barco amarrado na margem, parecendo estar esperando por ele. Sobe nele. A corrente é forte. O barco é levado depressa. Alis empunha os dois remos, freando e corrigindo o rumo, deixando-se levar por entre as margens que estreitam ou alargam a cada passo. De repente um som agudo o faz saltar, desequilibrando o barco".
A voz do contador retumba em alerta perfeito, tornando-se rouca e nervosa, como uma chicotada que fez a todos estremecer. Continua, com a voz chiada e assustadora.
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Kronos continua a contar a história, sem sua voz, a cena: "Enrolada num grosso tronco que tombou entre as duas margens do rio, Uma enorme cobra, tão grossa quanto um homem forte, com a pele decorada por losangos negros e amarelos, escancara a boca enorme em sua direção. Alis freia com os remos, olha para as margens, procurando onde encostar, mas as paredes são altas naquele trecho. Continua seguindo na direção na direção daquela boca enorme. Tenta remar contra a corrente, sem nenhum efeito. Não há espaço para passar. Decidido, agarra o cabo de sua longa faca. Já pode sentir o hálito venenoso da serpente. Puxa a faca até quase sair da bainha e firma o corpo para atacar, olhando firme os olhos oblíquos da serpente. Então, alguma coisa o faz hesitar. Empurra a faca de volta, segura os remos, levanta-os da água, deixando a corrente levar e apenas relaxa. A cobra silencia, fecha a boca e também parece relaxar. Alis passa por ela devagar, apenas estremecendo um pouco quando estavam bem próximos e a serpente estende a língua bifurcada até roçar de leve seu rosto. Volta-se, a serpente ainda olha para ele "".
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"O barco continua, seguindo uma curva larga do rio, continuando reto, sumindo logo à frente, sob uma formação branca. Aproxima-se. É uma larga escada branca, com degraus gastos. O barco bate no primeiro degrau. Alis desembarca e sobe cauteloso. Depois de subir muito, a escada acaba num pátio plano, com uma construção no centro. Tudo tem aparência antiga, mas não abandonada. É um templo imponente, com muitas colunas em torno. Entra por uma grande porta e encontra uma ampla sala, iluminada por chamas nas paredes. No centro, uma grande mesa de pedra, onde está enrolada a mesma serpente. Alis olha rápido para trás, com uma pergunta nos olhos e a serpente fala.
SERPENTE
Bem vindo, pequeno Alis.
ALIS
Quem é você? O que...
A serpente ri, o corpo enorme estendido na mesa e por metade da sala é sacudido, interrompendo Alis e apontando a faca com o focinho.
SERPENTE
Podia ter usado sua lâmina, eu teria deixado.
ALIS
O que aconteceria, então?
SERPENTE
O rio teria levado o barco até o outro lado do vale, de volta para casa, nada mais.
O menino reflete, entende. Começa uma pergunta, mas é novamente interrompido.
SERPENTE
Alis, nessa vida dia após dia tão igual a todo dia, aproveite todas as oportunidades para demonstrar que tem honra e dignidade. Esteja atento o tempo todo, pois esses momentos não são raros. Os verdadeiros heróis não perdem nenhum. Só os seres comuns deixam passar as oportunidades.
ALIS
Como saber qual o certo a fazer?
SERPENTE
Se é digno e honroso. Se, num desses momentos, faz a coisa errada, cai no lado sombrio, fica corrompido, malvado e insensível como muitos. Se não faz nada, fica nulo e apático, como a maioria. Agora, se age com dignidade e honra, vai para o lado iluminado e nem mesmo toda a força das sombras pode atrapalhar o seu caminho.
A serpente some, numa névoa tênue. Por um momento surge um homem grande e poderoso em seu lugar, sumindo também.
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A platéia está estática, todos ainda sob o efeito das cenas, silenciosa. As crianças estão concentradas.
KRONOS
E assim foi o primeiro ato heróico de Alis. Aquele dos grandes feitos.
Kronos se levanta e sai. Muitos reclamam e chamam por ele. As crianças perdem a timidez e se aproximam, puxando sua túnica para que volte. Ele as repele docemente e sai, andando devagar, de olhos baixos. Anjack e Mary saem para fora, seguidos por Davi e Gaia. Ela se apóia no braço dele.
MARY
Você vai partir em breve, não é?
ANJACK
Sim, vou servir à guarda. Mas, como soube?
MARY
Seus amigos me contaram.
Aponta um grupo de anjos e homens jogando bola ali perto.
ANJACK
Não há perigo, só treinar e patrulhar por um tempo.
Ela não se contém, toma sua frente, andando de costas e apontando o dedo no seu rosto.
MARY
Seu projeto de Eloín. Quem pensa que é? Sempre estudamos e brincamos juntos e agora. Agora! Vai se meter em perigos por aí.
ANJACK
Como assim? Agora? O que tem agora?
Diz, divertido com a reação dela. Ela volta ao seu lado, cruza os braços, arrependida.
MARY
Esquece, anjo idiota.
Ele é quem toma sua dianteira, fica na sua frente, andando para trás.
ANJACK
Espere. Como podia adivinhar que você se interessa por um voador?
Param. Ela o encara firme.
MARY
Eu não vôo, mas minha cabeça vive no ar.
ANJACK
E a minha sempre no chão, perto de você.
Ele quer puxar Mary para si, ela reluta. Gaia surge, voando baixo em torno deles e cantando.
GAIA
Anjack gosta Mary. Mary gosta Anjack. Gaia gosta dos dois.
Bem próximos, sem olhar para Gaia.
ANJACK
É preciso uma Gaia boba vir contar o que sentimos?
MARY
Todo esse tempo.
ANJACK
Nunca tive coragem.
Eles se beijam, devagar. Gaia dá gritinhos em torno, cobrindo-os com suas asas. Ela se afasta um pouco.
MARY
Vou servir, também. Vou para a base espacial, com meu pai.
Longo abraço.
MARY
É estranho. Você sendo um anjo.
ANJACK
Não. É só diferente. E por você, jamais voaria de novo.
Mary aponta uma mulher numa asa delta acima deles.
MARY
E quem disse que eu não posso voar?
Ele a abraça, carregando-a num vôo curto. Ouvem uma voz autoritária e pousam
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JON
Anjack!
Olham para cima, onde um anjo se aproxima.
MARY
É seu pai.
Anjack deixa Mary e sobe ao seu encontro. Ambos pairam nas correntes quentes do vento, as asas abertas como andorinhas. Jon está bem envelhecido. O rosto está duro, com profundas marcas de expressão e uma cicatriz entre o olho e o queixo. Tem olhar duro e severo. Veste uniforme militar completo e com muitos símbolos de autoridade. Tem armas em ambos os punhos, a espada presa nas costas com o punho aparecendo por cima do ombro. Anjack sorri e ameniza.
ANJACK
Perdeu o jogo, pai.
JON
Mas sei que venceu.
ANJACK
Onde esteve nos últimos dias?
JON
Organizando nossas defesas, pois não nos deixam atacar.
Mary brinca com Gaia no solo, olhando para os dois lá em cima, às vezes.
JON
Sua namorada?
Anjack parece constrangido e apenas acena confirmando. Jon mantém o olhar duro.
JON
Não se atrase para servir a guarda.
ANJACK
Pode deixar, pai.
Jon suaviza, paira mais perto dele.
JON
Sei que você não gosta da vida militar, mas todos temos que aprender a nos defender.
ANJACK
Eu sei, pai.
JON
Então volte para ela, filho. Aproveite bem o seu tempo.
Pisca para Anjack, com expressão de quem contém emoções mais românticas, despedem-se e Jon parte. Anjack observa sua partida e desce ao encontro de Mary.
MARY
Ele parece severo.
ANJACK
Desde que nasci. Mas só parece.
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Caminham e são cercados por amigos, anjos e homens, alguns casais. Davi pede.
DAVI
Anjack, diga um de seus poemas.
ANJACK
Não me lembro de nenhum, agora.
DAVI
Faça um, então. Você devia ser contador de estórias.
ANJACK
Então aqui vai um. É um aviso a todos vocês.
Cenas de casais abraçados, de Mary e os outros ouvindo.
ANJACK
Quando nos encontramos
Naqueles primeiros dias,
Imaginei, para sempre,
O quanto deveria ser doce.
Doce e profundo.
Como precisava ser gentil.
Gentil e poderoso.
Como poderia ser forte.
Forte e carinhoso.
Para não transformar você numa coisa amarga.
Imagens do rosto sofrido de Jon, com memórias de sua mãe e de guerras, solidão.
ANJACK
Mas o tempo foi passando,
Doendo e mudando.
Poderoso um dia,
Acabei coisa brutal.
O profundo que deveria,
Mergulhou em solidão.
O que gentil parecia,
Virou fraqueza, indecisão.
E quem era carinhoso,
Agora choraminga atenção.
Só a doçura,
Que eu mais protegia,
Ainda te resiste,
Amor erosão.
IV - Anjack Soldado
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Um quartel de anjos e homens parece mais com um mosteiro. Tem construções leves e bem adornadas. Pátios amplos e ensolarados, sem muros ou portões. A atitude dos soldados é mais de meditação e equilíbrio, do que de força e disciplina. Os uniformes são leves, a decoração é delicada. Anjack está no ar, compondo uma formação em leque que realiza manobras a grande altitude. Davi, no solo, olha para o alto, enquanto treina artes marciais com um grupo. Anjack está no extremo, na ponta da formação. O oficial no centro conduz as manobras com sinais curtos das mãos. A formação se mantém na horizontal, as asas paradas. A um sinal, a formação gira sem se alterar, com o oficial mantendo o centro, passando para vertical. Giram no sentido horário. Ao atingir altitudes diferentes, as extremidades do leque encontram diferentes correntes de vento, sendo preciso esforço e concentração para manter a formação. À medida que a formação passa da horizontal para a vertical, o esforço de Anjack é cada vez maior. Ao atingir o vertical perfeito, Anjack está no alto do leque, numa corrente de ar mais forte. O oficial está estável no centro e o anjo no outro extremo voa sem muito esforço. O soldado logo abaixo de Anjack, mais forte e musculoso, mal se mantém, quase desfazendo a formação. Anjack grita frases motivadoras.
ANJACK
Mantenha firme, Kael.
O oficial gesticula. Todos estendem os punhos armados para frente. Mantém a posição de tiro por longo segundo. Recolhem os braços ao longo do corpo. O oficial acena.  Todos se voltam e mantém a posição de tiro na retaguarda. Retornam à frente, a formação recomeça o giro, voltando à horizontal. Do solo, Davi observa a manobra, vê a descida, a formação se desfazendo um a um até que todos estão no solo. Corre para Anjack e Kael. Andam juntos. No ar, centenas de anjos se exercitam em manobras. Voam entre anéis estreitos, apanham objetos, entram e saem de veículos de transporte.
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DAVI
Ainda agüenta a noite de vigília?
ANJACK
E outra amanhã, com certeza.
Fala ofegante, sem muita convicção. Continuam andando, tomam um monociclo sem rodas. Davi dirige e Anjack monta atrás. Plano geral do quartel. O monociclo flutuando através de uma planície, rumando para um posto na beirada do altiplano onde fica o quartel. Instalado na beira de um penhasco que acaba numa planície desértica e pedregosa que se estende até uma escura cadeia de montanhas quase na linha do horizonte. Cena muda para a mesma cadeia de montanhas vista à noite, contra a luz das estrelas, com alguns pontos vermelhos como fogueiras, rastro de algum veículo aéreo indistinto ao longe.
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INT. ESCURO - NOITE
Binóculo usado por Anjack para vigiar as montanhas. Anjack olhando atento pelo binóculo, com outros soldados numa sala quase sem luz, cheia de instrumentos e telas, com estreitas e compridas janelas de observação. Entra um oficial. Um gato enorme se enrola em suas pernas, acompanhando seus passos.
OFICIAL
Fiquem atentos e não se iludam com a rotina. O meu bichinho aqui pode sentir um daemon muito antes de vocês.
O oficial se abaixa e afago o gato, que se enrosca na sua mão, satisfeito.
DAVI
Faz muito tempo que não atacam, senhor.
OFICIAL
Nós os enxotamos lá para as montanhas deles, mas estão se preparando para alguma coisa grande. Eu sinto isso.
ANJACK
Meu pai acha que devíamos ir até lá e acabar com eles.
OFICIAL
Seu pai é um grande guerreiro, mas todos os seres merecem viver sem interferências.
Anjack, não tira os olhos do binóculo, Davi salta para mais perto de sua tela.
DAVI
Objeto não identificado, no limite do radar.
OFICIAL
Faça comunicação.
DAVI
Vem do nosso lado. Não respondem. É um padrão novo.
OFICIAL
Amplie a freqüência e insista.
DAVI
Protótipo espacial. Avariado e caindo.
O oficial vai até a tela, Anjack está atento. No comunicador, uma voz com interferência.
OFICIAL
Ponto de colisão, as montanhas daemons.
VOZ
Impossível corrigir o rumo, isso só sabe cair.
O oficial se apruma. Sente um vulto passar rápido atrás de si. Grita.
OFICIAL
Formar grupo de resgate.
Alarmes soam, o oficial olha em volta. O lugar de Davi está vazio. O binóculo de Anjack ainda balança no tripé, abandonado. Volta-se rápido, sai para a porta e grita.
OFICIAL
A mim, Eloíns.
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EXT. NOITE
Anjack e Davi estão no motociclo. Davi dirige, com Anjack atrás. Estão no fundo da escarpa, saindo para a planície deserta.
DAVI
Você voa, eu faço voar.
ANJACK
Então voe!
DAVI
Podemos ser castigados por isso.
ANJACK
Até formar uma patrulha de resgate, a nave já caiu.
DAVI
Segure-se, então.
O motociclo desliza ainda mais rápido, deixando uma enorme nuvem de poeira.
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Plano geral do deserto. Num extremo, o posto avançado sobre as escarpas altas. Noutro, as sombrias montanhas daemons. A caminho, o motociclo identificado ao longe pela nuvem de areia que deixa na passagem. No alto, uma nave caindo, fumegando, em direção às montanhas. No céu, duas luas em diferentes estações, uma cheia e outra minguante.  Anjack olha para cima. No casco da nave, um painel onde estão os pára-quedas está avariado e não se abre. A noite já está chegando. O sol, já abaixo do horizonte, ainda ilumina a nave caindo. Todo o resto escurece depressa. As luas iluminam a planície. O painel se abre, soltando os pára-quedas. Anjack observa a abertura dos dois enormes pára-quedas prateados, brilhando intensamente sob os raios de sol, em contraste com as sombras que já chegaram ao deserto.
ANJACK
O vento vai leva-los para as montanhas.
Davi corrige o curso, calculando o local onde a nave pode cair. Anjack voa. Davi chama sem entender. Anjack voa com força, direto para cima e para a nave. Com muito esforço, aproxima-se, quase é atingido numa primeira tentativa de se agarrar nela. Tenta de novo, chegando por cima e pousando no casco. Procura o que fazer. Agarra uma das tiras do pára-quedas e puxa com força, mas não consegue nenhum resultado. Olha em torno, calculando. Toca o braço, olhando para o punho desarmado. Decidido, pega a espada e corta a tira com um golpe violento. A tira se rompe, o pára-quedas entorta e a nave sacode, entortando um pouco e caindo mais depressa. Anjack olha para as montanhas. Agarrando-se nas tiras, vai até o outro pára-quedas. Golpeia uma tira. Rasga um pouco, outro golpe e se rompe. A nave sacode e aderna, caindo mais rápido. Olha e calcula que agora vai cair antes de chegar às montanhas. Nas montanhas, nota movimento de naves e formas. Lampejos de armas. Apesar da grande distância, tiros já atingem o casco da nave. Quase no solo, Anjack voa. A nave bate com força, estabilizando precariamente no terreno irregular.Anjack procura uma porta. Encontra. Bate nela. Ajuda a abrir. Um tripulante humano sai, aturdido.
ANJACK
Alguém ferido?
TRIPULANTE
Nenhum grave. Fomos atacados em órbita!
Anjack ajuda mais dois a sair. Davi chega. Salta do motociclo com duas armas pesadas. Joga uma para Anjack. Toma posição na direção das montanhas, apontando para a noite fechada. Grita.
DAVI
Daemons chegando.
Anjack entra na nave e chama.
ANJACK
Mais alguém?
Ouve tiros lá fora. Impaciente, já vai saindo, quando ouve uma voz, indistinta ainda, dizendo aqui . Volta, um tripulante chega andando quase sem pressa, com um pequeno aparelho que ainda manipula com a cabeça baixa. Anjack vai até ele, pegando-o pelo braço. Ela levanta a cabeça.
MARY
Anjack?
ANJACK
Mary? O que... Vamos sair logo daqui.
Saem para fora. Davi atira furiosamente, usando a nave como escudo. Um veículo daemon está caído, em fogo. Na luz das chamas, muitos vultos escuros. Brilho de armas de fogo na escuridão além. Anjack mantém Mary atrás de si, enquanto atira, conduzindo-a em direção ao monociclo, onde os outros três tripulantes esperam. Anjack grita, sem parar de atirar, no meio do barulho de batalha.
ANJACK
Vá com eles.
Ela sobe. O motociclo é pequeno para quatro. Levanta com esforço. Anjack atira, mantendo os daemons à distância. Tiros estouram em sua volta, cada vez mais perto. O motociclo começa a se mover devagar, afastando-se. Anjack se desvia de tiros bem perto, rola. Levanta num vôo curto, sem parar de atirar, caindo perto de Davi.
DAVI
Recue, Anjack. Dou cobertura.
ANJACK
Não. Ficamos e seguramos os caras.
Lado a lado, atiram furiosamente. Recuam passo a passo. Anjack sente um ferimento no peito. Não vacila. Bate as asas, voando acima de Davi, atirando em Daemons que tentam passar por cima deles e alcançar os sobreviventes, ainda muito perto. São muitos inimigos, chegando cada vez mais. Atiram sem parar. De relance, vê o motociclo se afastando em segurança. Chegam mais atacantes. Atirando para um lado, é atingido com violência por um vulto. Cai no solo, levanta com a armadura rasgada. Um daemon enorme pousa em sua frente. Um guerreiro grande e forte. Usa os esporões armados com longas lâminas, chicoteando-as no ar à sua frente. Anjack olha para o alto, atraído por luzes. Vê passar veículos de combate e anjos. Muitos daemons sob a luz dos holofotes. Os daemons já não perseguem os fugitivos, lutam contra a patrulha. O daemon está concentrado em Anjack. Rosna.
DAEMON
Venha morrer, passarinho.
Desarmado, Anjack empunha sua espada. O daemon avança com os esporões esticados. Anjack salta para trás e para cima, batendo as asas. Os esporões encontram o vazio onde ele estava. Anjack desce com os dois pés no peito do daemon. Ele desvia, usando os punhos e os esporões. Acerta Anjack, que cai. O daemon avança sobre ele, envolvendo-o com os braços e com as enormes asas. Anjack o empurra. O daemon olha para o próprio peito, incrédulo, onde só aparece o punho da espada de Anjack. Dobra os joelhos e cai com as asas se debatendo até parar. Anjack, chocado, é despertado pela voz de Davi. Anjack procura o amigo. A patrulha está recuando. Muitas luzes se aproximam das montanhas. Davi e Anjack se encontram, sobem num veículo da patrulha. Anjack pega uma arma e atira com os outros. Os daemons desistem da perseguição, voltam, cercam a nave caída. Anjack avista o motociclo e voa paralelo a ele, gritando para Mary.
ANJACK
Você está bem?
MARY
A nave! Os daemons não podem capturar a nave.
Ela segura ainda o pequeno aparelho. A nave está sendo cercada por tanques e daemons satisfeitos com o achado. Mary aperta o aparelho. A nave explode. Destrói tanques e causa grande destruição ao redor. Anjack se volta para ver. Segue o motociclo.
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Chegando no pátio do posto, Mary desembarca, abraça Anjack. Olham-se e estão prestes a se beijar quando chega Davi, sujo e desfeito. Abraça os dois ao mesmo tempo.
DAVI
Onde tem confusão...
Anjack e Mary continuam a frase, interrompendo os olhares românticos e se dando conta da agitação de soldados ao redor.
ANJACK E MARY
Fomos nós que começamos.
O oficial interrompe a comemoração dos três. Os dois se aprumam. Encara com olhar severo. O oficial apenas olha de volta para Mary.
OFICIAL
Será levada para sua base agora mesmo.
Examina os ferimentos no peito e nos braços de Anjack.
OFICIAL
Vá tratar disso, apressadinho.
Mary ampara Anjack, levando-o pelo braço.
MARY
Vou com ele.
Seguem até uma sala pequena. Muitos soldados sendo tratados ao mesmo tempo. Uma enfermeira conduz Anjack. Senta numa cadeira. A enfermeira olha seus ferimentos. Com gestos rápidos espeta finas agulhas de acumputura. A expressão de Anjack se alivia. Retira a armadura, limpa e aplica adesivos nos ferimentos, enquanto conversam.
ANJACK
Apesar das circunstâncias, é bom ver você.
MARY
Tanta saudade e agora ver você assim, ferido.
ANJACK
Coisas de soldado. Estes valeram a pena.
MARY
Dói muito?
ANJACK
Nunca doeram, só a saudade.
Davi se aproxima, com duas grandes sacolas.
DAVI
Anjack, vamos juntos para a base.
MARY
Parece que não querem vocês por aqui.
ENFERMEIRA
Chegando na base, vá ao hospital.
V - A Última Batalha
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O veículo de transporte, com grandes balões e painéis solares, chega à base. Uma longa pista de pouso, muitas torres em volta, postos de defesa e angares enormes. Desembarcam. Entram num domo de aparência sólida, tomam um elevador para baixo. Saem direto numa grande sala de controle. No centro, uma grande mesa com muitos oficiais. Um deles, corre para Mary. Abraçam-se com força mas depressa.
PAI
Agora, conte o que aconteceu.
Ela vai até a mesa, insere um disco numa abertura. Surge um holograma com o planeta visto de órbita. Enquanto ela fala, as cenas acompanham.
MARY
Os testes com a nave foram perfeitos. Lançamento e órbita como previsto. Mas, ao circundarmos o território daemon, descobrimos isso.
Vales profundos, montanhas, cânions enormes. A imagem desacelera. Numa fenda profunda, a imagem fica azulada, vermelha, como se vista através de filtros diferentes.
MARY
Na primeira passagem, detectamos intenso movimento nesta região, para onde convergem grandes quantidades de energia, combustíveis e metais. Ali constroem tanques e bombardeios com autonomia para grandes distâncias. Até aqui, nenhuma novidade. Mas, nesse ponto...
A imagem amplia, um pequeno ponto. Amplia de novo. É um veículo triangular, negro..
MARY
É um novo bombardeio. Só o descobrimos pelos instrumentos óticos. Não foi detectado por radar ou por sensor termo-acústico.
Todos se agitam. O pai de Mary pede silêncio.
PAI
Esse é o resultado evidente do estágio científico deles. Mas acreditamos que o bombardeio invisível não é o nosso principal problema. Explico. Durante séculos, os daemons se mantém isolados, alimentando ódio contra todas as outras formas de vida. Enquanto usamos a força do sol, do vento, da biomassa e dos gases não inflamáveis, eles optaram por combustíveis fósseis poluentes, pólvora e metalurgia. Atualmente, seus recursos naturais estão minguando e eles precisam aumentar seu espaço vital. A conseqüência natural é o uso de formas de energia ainda mais eficientes, mas sujas e perigosas. Uma delas, conhecemos em teoria, mas não utilizamos, a divisão atômica.
Mais agitação na sala. Mary ajusta o controle na mesa e o holograma muda a imagem, para um ponto no solo, que treme e emite campos de força em ondas.
MARY
Na segunda passagem, registramos uma explosão nuclear subterrânea. Como já desconfiamos, estão realizando testes bem sucedidos.
PAI
É uma energia instável e muito perigosa, principalmente pela natureza de nossa atmosfera.
Mary desliga o holograma.
MARY
Em seguida, fomos atingidos por alguma coisa. Mísseis, talvez. Não foi sequer identificado, mas nos atingiu em órbita. É tudo.
Ela sai, todos cercam o pai, gesticulando. Anjack, até então apenas observando, sai com ela. Andam por corredores enquanto conversam.
ANJACK
Eles são inteligentes e perigosos, uma combinação mortal.
MARY
Seu pai sempre teve razão, Anjack. Mas acreditávamos que ainda podíamos conviver em paz.
Entram por uma porta, para um hangar enorme. No meio, uma imensa nave em construção. Anjack olha, surpreso. Plano aéreo do lugar.
MARY
Estamos construindo essa nave para explorar Gea. Começo a achar que nunca vai sair do chão.
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No centro da base espacial, numa plataforma flutuante bem acima, com diversas antenas apontadas para todos os lados. Há outras torres menores espalhadas em volta, à distância. Três anjos vigiam com potentes binóculos. Um deles é Anjack. Pressente um movimento, aponta o binóculo. Uma enorme formação aérea surge no horizonte, aproxima. Uma formação de anjos, de grandes veículos de transporte e muitos menores em torno. No solo, outros veículos pela larga avenida. Um dos veículos no céu sai de formação e vem para a base. Homens e anjos olham maravilhados e surpresos a grande formação que se aproxima. Anjack ajusta o binóculo. Da nave, sai um oficial. É  Jon. Anjack salta da torre, voando para ele. Aproxima-se e abraça Jon. Ele está sério como sempre. Respondendo ao olhar de Anjack.
JON
Finalmente marchamos contra os daemons.
ANJACK
Vou me juntar a você.
JON
Não, você deve ir com os colonos para Gea.
ANJACK
Pai! Não pode me pedir ou impedir. Servir é voluntário e eu escolho ficar a seu lado.
JON
Não entende? Não posso perder você também.
ANJACK
Quero lutar ao seu lado.
JON
Filho, nós acordamos muito tarde para essa guerra. Eles têm centenas de mísseis nucleares prontos e até o próprio projeto espacial.
Olha para Mary, que chega assustada.
JON
Vá com ela para Gea. Vão precisar de ajuda militar e você está preparado.
Olhares de Anjack e Mary. Cresce o som da formação passando sobre a base. Jon não espera a reação deles. Prossegue, revelando emoção.
JON
Proteja-a e faça por ela o que não fui capaz de fazer por sua mãe.
Jon sacode o rosto, espantando a emoção. Pega Anjack pelos ombros, com olhar intenso. Os oficiais em volta demonstram impaciência. Jon se afasta, cercado por eles, caminhando para a base. Grande movimento de soldados em torno de Mary e Anjack, esquecidos no meio deles. Plano geral. Soldados vão para veículos de transporte, correria de outros, transporte de equipamentos pesados e caixas de munição. Veículos decolam, juntando-se à formação. Outros saem para a estrada, juntando-se ao comboio. Mary se aconchega em Anjack, que a abraça, em meio ao intenso movimento. Como se abandonados. A enorme formação acima lança sombra na base.
Passagem, o som de asas aumenta, estalos, ruído de motores e máquinas. Ordens gritadas.
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EXT. ALVORECER
Anjos saem de veículos e voam, em diversas altitudes, juntando-se a outros, formando batalhões no ar, em quadrados espaçados. Outros veículos, todos de formatos variados e claramente adaptados, aterrisam e desembarcam homens, que formam batalhões no solo. Anjos cavalgam pássaros em grandes formações. Milhares de anjos e homens, entre tanques e naves, indo na direção das montanhas. Movimentam-se quase silenciosos, concentrados e organizados. Veículos rápidos atacam trincheiras e cavernas. Os daemons atiram neles de baterias e trincheiras espalhadas pela face da cordilheira. Algumas são destruídas. Aviões são derrubados e chocam-se com as paredes de rocha.
Batalhões de anjos e homens se agrupam, longe do alcance dos canhões. Grandes pássaros protegidos por armaduras e cavalgados por homens, circulam distribuindo ordens.
De dentro de uma casamata, um daemon observa o exército de anjos manobrando.
Vista por trás das montanhas, interminável contingente de soldados daemons no solo, muitos voando, centenas de tanques e veículos aguardando. Jatos passando por eles, contornando os picos e atirando nos aviões de anjos que atacam as baterias. Os soldados rosnam e gritam para o alto, inquietos, saudando os jatos, brandindo as armas, batendo as asas. Gritam quase juntos quando um avião inimigo cai, atingido pelas baterias.
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Jon está na frente de uma nave de desembarque, olhando para os picos ameaçadores e pontiagudos que se aproximam depressa. Um anjo muito jovem ao seu lado parece com medo. Nenhum barulho se ouve, além do vento cortado pelo veículo, bastando-lhe sussurrar para o rapaz ao seu lado.
JON
Não pense no depois. Apenas no agora.
RAPAZ
Sim, senhor.
JON
Lembre das boas coisas que viveu. Vai saber por que lutamos.
RAPAZ
O que há do outro lado?
JON
Loucura. Vivemos do vento e do sol. Eles vivem do óleo e da guerra. Temos apenas os filhos que podemos cuidar. Eles produzem milhões de soldados.
Som de explosões próximas. O veículo mergulha, apontado para além das montanhas. Dezenas de outros, ao mesmo tempo, precedidos de aviões de escolta que mergulham na frente, atacando baterias. O rapaz agora grita, para ser ouvido acima do barulho de tiros e explosões.
RAPAZ
E estão todos esperando por nós.
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EXT. DIA
Mary está de frente para o nariz da nave. Agora está num grande hangar, na superfície. Alguns andaimes ainda instalados em volta. Máquinas ligadas a ela por grossos cabos. Ela tem os braços cruzados, depressivamente. Olha para cima, medindo a grande nave. A base está silenciosa, com poucos soldados e nenhum movimento de guardas. Anjack se aproxima.
MARY
Alguma notícia?
ANJACK
Começou o avanço. Tantos amigos e inimigos. Possam suas almas descansar.
MARY
E sobre a nave?
ANJACK
Ainda estão decidindo. Você devia estar lá, ajudando a convence-los.
MARY
Vocês, anjos, esperam demais das pessoas. Até dos inimigos. Deixe que decidam.
Ele respira fundo, envolve-a com um braço. Ambos olham a nave, pensativos.
Som agudo de alarme. Davi chega correndo, atrás dele muitos técnicos, mecânicos e pequenos carros transportando equipamento.
DAVI
Decidiram! A nave vai partir.
MARY
O que houve?
DAVI
Estamos avançando e vencendo, mas há grande atividade nas bases de lançamento. Acham que vão usar as armas atômicas como último recurso.
ANJACK
Aqueles pobres loucos.
MARY
Quanto tempo temos?
DAVI
Duas horas, talvez.
Mary sai da apatia. Enquanto fala, caminha pelo hangar, distribuindo ordens.
MARY
Vamos com isso. Quero aqueles balões calibrados. Abram os porões. Tragam os suprimentos para o hangar. Anjack, vamos partir. Retirem todo o equipamento científico. Carreguem comida, água e ar para mais passageiros. Essa não é mais uma missão científica.
Movimento de trabalho, a nave sendo preparada, grandes caixas carregadas para dentro, cabos se soltando, andaimes afastados, a porta se abre, a nave sai do hangar majestosa, para a pista quase deserta, sob festejos dos técnicos. Grupos se reúnem em torno, o pai de Mary e outros civis. Crianças são acordadas, homens e mulheres apressados  juntam objetos, seguem todos para a nave. Grandes balões são inflados em torno da nave, os gases são azuis, passando a vermelho e depois ao dourado intenso. Os cabos que a prendem se soltam e ela flutua a centímetros do chão. Técnicos se posicionam diante de painéis. A nave é descarregada de caixas e carregada com outras. Armas são retiradas. Voz no ambiente.
VOZ
Todos os selecionados para o lançamento, reúnam-se na nave.
A correria aumenta. Mulher pega o filho pela mão. Casais caminham depressa.
Mary, na entrada da nave, espera o grupo que se forma. Panorâmica de homens e mulheres, muitas crianças, grupos de anjos. Um grupo vestido de roupas azuis, se destaca da maioria. Anjack toma a frente e se dirige a todos.
ANJACK
Temos mais espaço do que o planejado. Além da tripulação prevista, vamos levar mais gente. Esta será uma viagem de colonização.
Foco no grupo de azul, reunido em frente. Na maioria, técnicos. Movimento entre eles. Um dos mais velhos, se afasta. Aponta um casal e dá sinal para que sigam no seu lugar. Junta-se aos demais. Famílias se aproximam, homens, mulheres e crianças. Mais velhos encorajam mais jovens a ir, até empurrado-os na direção da nave, quando esboçam recusa, assim despedem-se dos outros e se juntam ao grupo de azul, agora já minoria. Uma criança bem pequena agarra com força uma sacola grande demais para ela. Um anjo muito jovem é empurrado para o grupo. Um grupo de soldados anjos, machos e fêmeas, posiciona-se, Davi entre eles. Agora o grupo é mais numeroso, com homens e mulheres jovens. Mary acena que é suficiente, constrangida por não poder mais. O pai se aproxima.
PAI
Os mísseis foram lançados, precisa partir imediatamente.
MARY
Não há nenhum outro meio?
PAI
Nenhum. Tememos pelo pior. Somos um dos primeiros alvos. Quem sabe, possam voltar, um dia?
MARY
Quem sabe...
PAI
Embarquem imediatamente. Toda nossa fé em vocês. Vamos, não há mais tempo.
Ele comanda com gestos decididos e autoritários. Ela chora. Lágrimas silenciosas. Técnicos e colonos se despedem. Anjack reúne o grupo de anjos. Todos sobem a rampa, olhando para os que ficam.
PAI
Vocês, não fiquem parados. Temos uma nave espacial para lançar.
Concordam e correm para a entrada da base, indo ocupar seus postos. Cabos se soltam com estalos. A porta se fecha. A nave começa a subir, lentamente.
Mísseis em curso e sendo lançados. Anjos e homens em veículos rápidos tentam interceptação, um é destruído, outros escapam. Um míssil cai no meio de uma cidade, explosão com grande cogumelo, mais achatado e vermelho, com grandes línguas de fogo.
A nave se eleva, devagar e silenciosa, cada vez mais rápido e alto. Grandes painéis solares posicionando-se em torno, como uma grande flor dourada. Davi comanda a subida. Os técnicos na base diante dos visores, o pai de Mary sorri, atento.
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EXT. CAMPO DE BATALHA - DIA
Muitas naves bombardeiam as montanhas, batalhões de anjos reunidos em bloco, se abrem em formações ordenadas, em leques simultâneos, em camadas sobrepostas, atacando as trincheiras na montanha. Veículos escalam as montanhas. Início da poesia com a voz de Jon abafando o barulho da batalha. Cenas em velocidade um pouco mais lentas. Aviões furam as defesas daemons. Tropas desembarcam a seguir e avançam. Anjos saem de transportes em pleno ar e atacam as linhas de defesa. Daemons voam de encontro aos anjos. Veículos desembarcam homens no solo, sob fogo cerrado, que correm para destruir tanques e trincheiras. Muitos mortos e feridos de ambos os lados. Pássaros caem atingidos por tiros e explosões, Daemons lutando com ferocidade. Anjos com determinação. Homens com bravura. Jon voando na direção de uma bateria antiaérea e destruindo. Seu rosto congestionado. A memória de Anjack bebê, voando pela primeira vez.
Sonharei contigo,
Longínqua e inacessível para sempre,
Como torre inexpugnável
Que nunca será tomada.
Sonharei contigo,
Irresistível como a marcha das geleiras
Ou um sonho indecifrável
Que nunca será retratado.
Sonharei contigo,
Perdido nesse vale de sombras,
Por mundos sem vida
Que jamais serão habitados.
Sonharei contigo,
Que me deixou vazio e vivo,
Louco cheio de dor.
Abandonado.
Volta a velocidade normal, o ritmo normal da batalha. Luta em plano geral. Anjos rompem as defesas e avançam contra milhares de inimigos que saem de cada rachadura das montanhas, em nuvens negras intermináveis. Naves de combate cruzando o céu. Invadem a planície suja, rochosa e coalhada de máquinas de guerra e inimigos.
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NO ESPAÇO
A nave já chega no espaço. Chamas brancas dançam dentro dos balões dourados. Na superfície do planeta, cogumelos de fogo surgem em alguns pontos.  Surgem outros, alastrando-se por todo o planeta. Davi, sentado nos controles, com Mary e Anjack em pé atrás dele, são iluminados pela luz das explosões. Davi, engasgado, tenta aparentar segurança.
DAVI
Vamos prosseguir.
Os balões encolhem em volta da nave, ao mesmo tempo em que jatos dourados escapam pelos foguetes atrás da nave. Arremete em direção ao espaço.
Na base, um míssil atinge a periferia. Na sala de controle, o pai se Mary está olhando para a imagem da nave se afastando, com olhar satisfeito. A sala é sacudida e as luzes se apagam, com ruído de coisas quebrando e esmagando.
Rostos angustiados de Anjack e Mary, Abraçam-se, enquanto novas explosões surgem na superfície do planeta.
O contador de estórias, fustigado por um vendaval, sua túnica esvoaçando, no alto de uma montanha, em frente de uma casa simples, vê o fogo se aproximando no horizonte.
Gaia chora, abraçada a um voador pequeno. Anjos voam e são colhidos pelo mar de fogo. Nuvens cultivadas são vaporizadas pelo fogo. Daemons apavorados numa grande caverna que desaba.
Nenhum ponto da superfície do planeta está visível sob o mar de fogo e fumaça negra. Longo grito de agonia.
VI - Para Gea
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INT. NAVE
A nave viaja pelo espaço. Com os painéis solares movendo-se delicadamente procurando a luz do sol. Uma janela com Gea no centro, bem distinta, agora quase inteiramente azulada, apenas com algumas partes em cinza. Mary procura alguma coisa, entre grandes caixas numa sala de depósito. Ouve e tenta localizar um gemido fraco e distante. Anjack vem pelo outro lado e eles se encontram com surpresa.
ANJACK
Também está ouvindo?
MARY
Estou, mas não sei o que é.
Param, ouvindo com atenção. Um gemido fraco e abafado. Anjack aponta para o canto escuro da sala, atrás de uma pilha de caixas menores.
ANJACK
Por ali!
Aproximam-se devagar, o gemido fica mais forte. Ouvem também uma voz infantil também. Antes de dobrar o canto de uma grande caixa, espreitam. No final do estreito corredor formado pela caixa e pela parede, duas meninas estão abaixadas, falando baixo. Anjack e Mary se aproximam, sem ruído. Somente quando olham por cima das meninas, para olhar o que fazem, é que elas percebem a presença dos dois. Viram-se, assustadas. Numa caixa pequena, cheia de trapos, uma gata ronrona com quatro gatinhos agarrados em suas tetas e emitindo miados fracos. As crianças ficam desesperadas. A mais nova pega na mão de Anjack.
CRIANÇA
Anjack, por favor, Anjack. Vamos ficar com eles. Por favor. Eles não tomam espaço. Damos a nossa comida para eles. Por favor.
Mary se abaixa.
MARY
Calma, criança. Está bem, nós deixamos. Aliás, nunca proibimos.
CRIANÇA
Verdade? Obrigado, Mary. Obrigado, Anjack.
Os dois observam as crianças por um segundo, Anjack afaga os gatinhos e diz.
ANJACK
Eles sempre detestaram os daemons.
CRIANÇA
Isso mesmo, eles espantam os daemons, não é, Anjack?
ANJACK
É verdade, conheci um oficial que sempre andava com seu gato.
Saem, deixando as crianças cuidando dos gatos. Anjack e Mary param diante da janela e ficam abraçados, olhando Gea. As crianças vieram atrás deles, carregando a caixa com os gatinhos e a gata. Uma das crianças se aproxima. Puxa a asa de Anjack e aponta a janela.
CRIANÇA
Será que ela já está curada?
Anjack se abaixa e afaga a menina.
ANJACK
Quase. Você vai poder brincar lá.
Ela se afasta, levando os gatinhos e a gata muito incomodada atrás. Fala para a outra.
CRIANÇA
Vamos brincar em Gea.
Anjack se levanta e fala sorrindo para Mary.
ANJACK
Estou certo, não?
MARY
A atmosfera ainda está limpando. É diferente da nossa, mais densa e rica.
ANJACK
Boa para um anjo?
MARY
Vocês gostam de ar mais tênue. Talvez. Só saberemos quando chegar.
Olham para Gea, de mãos dadas. Ele aponta os dois.
ANJACK
Sabe onde está se metendo?
MARY
Só sei que amo.
ANJACK
Não somos fáceis, sabia? Anjos nunca se separam.
MARY
Ouvi estórias.
ANJACK
Todas verdadeiras. Um sempre sabe o que o outro sente, sem palavras e a qualquer distância. Sabe até o que o outro está fazendo. Criam uma ligação tão forte que a separação é penosa. Mesmo muitos anos depois, o laço permanece intacto.
MARY
Com alguns humanos também é assim.
ANJACK
Abençoadas a viver para sempre juntos?
MARY
Tão incompletos quando um dos dois vai embora.
ANJACK
Agora entende meu pai.
MARY
Sempre entendi. Sozinho, o ódio aos daemons o manteve vivo.
Ela nota o pesar de Anjack. Saltita em sua frente, para mudar o assunto.
MARY
Estamos no meio do caminho. Pelo tempo de Gea, dois meses de viagem.
Ele olha para a janela e aceita mudar de assunto.
ANJACK
Quando menino, e não faz muito tempo, ficava olhando as estrelas e imaginando que podia voar entre elas.
MARY
Coisa de poeta.
ANJACK
Coisa de criança.
MARY
E como era?
Anjack olha sonhador para Gea, cena de crianças brincando na nave, de Gea e do sol, da nave brilhando no espaço. Saem, abraçados. Corte para ambos nus, em gravidade nula, ao final do poema.
ANJACK
Serei uma nave
Azul, de cristal.
Brincar de roda entre planetas,
Saltar de sol em sol.
Deslizar entre os sistemas
Como uma lágrima de metal,
Deixando um rastro luminoso,
De saudade e solidão.
Quando chegar em outro mundo,
Lembrarei de você.
Ao olhar para as estrelas
Tão perto do peito e tão longe das mãos,
A imaginar o teu sorriso
No contorno das constelações.
Opcional: Atrás da nave, um ponto escuro no espaço. Aproxima, até ficar evidente ser uma nave daemon.
VII - Gea
37
Corte rápido. Oceanos azuis e calmos. Nuvens, ruídos, a nave treme e sacode. Ruído de metal torcido. A nave entra na atmosfera. Continentes e mares passando. Gases são expelidos pela frente da nave, formando um cone protetor. Grandes balões começam a inflar como colchões de gás azul, contornando toda a nave. A nave cai rápido. Inflados, os balões mudam de cor, até o dourado. A nave estabiliza, passando a flutuar suavemente. Num continente semelhante ao atual asiático, entre dois grandes rios, aterrisa suavemente.
38
Abre-se a porta, em rampa. Anjos saem em formação, cuidadosos. Crianças forçam passagem entre suas pernas e saem correndo para fora. Os anjos dão espaço, conformados e guardando as armas. Outros colonos saem, olhando para todos os lados, curiosos e maravilhados com as árvores em volta da clareira e com o grande rio. Um homem desce com um casal de cavalos pela rampa e deixa que corram pela praia. Alguns anjos tossem. Saem Anjack e Mary, seguidos por Davi. Anjack tosse e pisca. Ventos fortes e raios ao longe, no céu azul com pesadas nuvens ao longe.
DAVI
Depois do ar reciclado da nave, até o cheiro de Gea é melhor.
MARY
Vão devagar. A atmosfera é muito rica e densa.
ANJACK
É lindo. Tão... orgânico.
Outros anjos tossem e cambaleiam. Os homens parecem não sentir os efeitos do ar com tanta intensidade. Continuam a sair da nave.
ANJACK
O ar queima os pulmões e penetra nos ossos como se fosse óleo.
Mary o ampara. Ele resiste e se recupera, com respirações curtas e ritmadas.
ANJACK
Vamos, temos um planeta inteiro para descobrir.
39
Todos saem para fora, espalhando-se pela clareira, pelas árvores em torno, correndo para as margens do rio, pegando punhados de terra, tocando as árvores. Crianças correm até cair, levantam e continuam a gritar e rir. Vista do céu. Vista do alto, a nave aterrisada na beira do rio. Em torno, uma grande tenda armada, muitas caixas ao redor. Mais longe, muitas construções iniciadas. Homens e anjos circulando com ferramentas, carregando toras e tábuas, rolando pedras. Mulheres com cestas de alimento e crianças correndo, Clima de trabalho e alegria. O anjo mais jovem paira no ar, imóvel, com as asas abertas, como uma andorinha, corrigindo levemente a posição de vez em quando. Vigia a floresta. Anjack e outros levantam uma grande armação de parede, juntando-a com outras três já posicionadas, encaixando-as. Satisfeito com o resultado, segura até que os encaixes sejam colocados. Solta e verifica que está solidamente colocado. Uma criança se aproxima e oferece água. Ele bebe, sedento. Ao levantar a cabeça enquanto bebe, estremece. Tira o copo dos lábios sem baixar a cabeça, olhando fixamente para o céu. A criança pergunta, olhando para o ponto que ele fixa, sem nada ver.
CRIANÇA
O que foi?
Ele devolve o copo, afaga sua cabeça e sorri, disfarçando preocupação.
ANJACK
Não é nada.
Anjack sai em direção à entrada da nave. Cruza com Mary, que percebe sua atitude concentrada e apressada, seguindo atrás dele. Entram na ponte de comando da nave.
MARY
O que está acontecendo?
Quieto, ele liga uma tela, ajusta a imagem, procura, localiza um ponto escuro, aproxima. Afasta-se e aponta. Na tela, uma grande nave escura, ainda fumegando, caindo. Nesse momento, grandes pára-quedas se abrem, estabilizando com dificuldade a grande estrutura.
ANJACK
Eles conseguiram.
40
Sai para fora. Mary segue. Anjack chama Davi. Mary percorre correndo a clareira, chamando e apontando para a entrada da nave. Rapidamente, todos vão deixando o que fazem e se reúnem em torno de Anjack. Ele olha para o céu. Seguem seu olhar. Um pequeno ponto escuro ainda muito alto, sendo levado pelos ventos para mais longe. Murmúrios de indagação, depois de horror. As crianças ficam assustadas e procuram os pais. Os anjos se adiantam e tomam posição em torno de Anjack, com ar disciplinado e decidido. Mary avalia a situação e a atitude dos anjos e fica na frente de Anjack. Ele se volta para os anjos.
ANJACK
Às armas!
MARY
O que vai fazer?
ANJACK
Vamos até eles. Surpreende-los, antes que se organizem.
MARY
Mas podem ser colonos, assim como nós.
Ele olha nos olhos dela, se acalma, se dirige a todos.
ANJACK
Não vamos nos enganar de novo. Eles nunca quiseram nos conquistar, dominar ou escravizar. Só nos destruir. Aquela não é uma nave colonizadora. É uma nave de guerra.
MARY
A guerra destruiu o nosso mundo.
ANJACK
Eles trouxeram a guerra para este.
MARY
Por favor, Anjack.
Ele pensa. Anjos retornam de dentro da nave, carregados de armas, armaduras e espadas. Dão-lhe suas armas. Veste os dois punhos, guarda a espada, sem olhar para Mary. Quando termina, olha firme para ela.
ANJACK
Eles terão a escolha da paz. Eu prometo.
Ordena aos anjos.
ANJACK
Deixem todo peso desnecessário. Sem armaduras e sem mantimentos. Somente armas e munição. A mim, Eloíns!.
Toma impulso e voa. A maioria o segue de imediato. Alguns precisam de uma segunda tentativa. Ao todo, vinte (?) anjos. A tarde chega, recortando o vôo dos anjos no céu vermelho e negro, riscado por raios nas nuvens distantes.
VIII - A Batalha Eterna
40
EXT. DIA
Voando, o grupo de anjos bate as asas com muito esforço, sentindo a força do vento e o ar denso. Anjack também está arfante.
ANJACK
Respirem fundo e devagar, Eloíns.
Alguns batem as asas desordenadamente. A nave cai, muito além da linha do horizonte, lentamente arrastada pelo vento. A formação em amplo leque está se desfazendo. Anjack sinaliza para o chão e desce, seguido sem nenhuma disciplina pelos anjos cansados. Chegam num ponto rochoso e alto e se reúnem em círculo, os anjos com expressão cansada e envergonhada.
ANJACK
Precisamos aprender a voar nesse ambiente. Para isso, voei observando os pássaros daqui.
Ao longe, um grupo de patos voando. Anjack pega a espada e risca a pedra, fazendo um "V".
ANJACK
Vamos voar em maior altitude, onde o ar é mais tênue. Lá, os ventos são mais fortes e temos que aprender a usa-lo. Se mantivermos essa formação, apenas o primeiro sentirá maior resistência do ar. Revezando sempre a ponta, enquanto os outros descansam. Vamos usar as correntes de ar, usando as mais quentes, batendo as asas com economia de energia.
Levanta-se. Todos parecem ter entendido. Decolam com alguma dificuldade. Bem alto, tomam formação em "V" e sentem a facilidade de voar assim, batendo as asas bem devagar e compassado. Apenas Anjack, na ponta, bate as asas com mais freqüência. Sinaliza e o anjo ao seu lado toma seu lugar. Vôo nas alturas, devagar e compassado, com ar majestoso.
41
EXT. NOITE
A lua encontra uma brecha entre nuvens escuras de tempestade e sua luz ilumina as marcas na floresta, deixadas pela queda da nave. O rastro longo e largo dos troncos estraçalhados de árvores derrubadas e vegetação amassada. Grandes pára-quedas negros estendidos sobre a copa das árvores, com gotas de orvalho brilhando ao luar. Suas cordas grossas ainda apontando para a enorme forma escura da nave, cercada de luzes em movimento e flashes de fogo. Os anjos voam baixo, pousando sobre a copa das árvores a uma distância segura.
Os daemons usam as armas para abrir uma clareira em torno da nave. Longas rajadas ecoam pela noite silenciosa. Enquanto soldados metralham os troncos das árvores até derruba-las, outros arrastam os restos para um lado da clareira. Um gamo é atingido pelos tiros. Os soldados riem. Soldados instalam lâmpadas em postes ao redor da nave, iluminando por inteiro a nave enorme, de metal bruto sem nenhum acabamento, oxidada em muitos pontos. Um soldado monta uma antena parabólica. Mais daemons descem pela rampa da nave. Alguns tossem, outros respiram com dificuldade. Os mais fortes riem deles, espancado-os por diversão, chutando-os para que carreguem caixas pesadas para fora da nave. Um anjo próximo de Anjack.
ANJO
Atacamos agora? Ainda não estão preparados.
ANJACK
Prometi que não seria assim.
ANJO
Nenhuma criança. Nenhum colono. Só guerreiros e material bélico.
Voz esganiçada de um oficial dando ordens numa língua estranha. Um daemon trabalha com maçarico num lado da nave. De repente, uma rampa se abre, caindo no chão com estrondo. O oficial grita. Saem da rampa soldados arrastando uma pesada bateria, descem a rampa e empurram até o meio da clareira. O oficial que comanda olha com medo para as árvores escuras em torno, exigindo mais pressa dos soldados.
ANJO
Vamos atacar agora.
ANJACK
Protejam-me.
Sem aviso e para surpresa do anjo, salta do galho para a borda da clareira, vibrando as asas como um colibri, produzindo som contínuo e grave, pairando a um metro do chão e sob a luz direta de um holofote. O soldado mais próximo cai para trás, assustado. Engatinha, patina na grama úmida, levanta e corre. Soldados ao redor se assustam também, mas ficam paralisados e com medo. O primeiro oficial corre até o oficial., puxa seu braço. Ele se volta e com um safanão das asas derruba o soldado, está irado. Caído, o soldado aponta Anjack. O oficial se surpreende. Pensa. Corre para um monte de armas empilhadas no chão da clareira. Pega uma e aponta para Anjack. Ele permanece na mesma posição, com os olhos baixos e as mãos desarmadas à frente. O daemon olha para seus soldados, nenhum deles se move. Apenas o primeiro soldado se arrasta até as armas e pega uma delas, apontando para Anjack. O oficial caminha devagar em sua direção, olhando para ele e para as árvores escuras por trás. Mede a distância entre ele e os outros soldados. Com olhar covarde, percebe que está só. Grita para os soldados.
OFICIAL
Peguem as armas e me cubram, seus inúteis.
Alguns correm para as armas, outros continuam com medo. Quando se posicionam ao seu redor, o oficial fica corajoso. Aponta cuidadosamente a arma para Anjack, engasga e fala com sotaque carregado.
OFICIAL
É uma armadilha, anjo miserável?
Anjack não levanta os olhos, falando com calma e suavemente.
ANJACK
Venho pedir paz.
O oficial fica genuinamente surpreso. Olha com o canto dos olhos para seus soldados, chega a baixar um pouco a arma.
OFICIAL
Paz?
ANJACK
Sim. Somos os últimos de nossa espécie. Já destruímos nosso mundo. O que nos resta, senão paz?
O oficial abaixa a arma, incrédulo. Ri baixinho e sarcástico. Acena para Anjack e dá meia volta. Andando, se volta e diz, divertindo-se.
OFICIAL
Espere aí.
Corre para a nave, arrastando as asas grandes, rindo ainda mais. MURMURANDO PALAVRAS EM SUA LÍNGUA GUTURAL, DIVERTIDO. Os soldados dão uns passos, cercando Anjack. Ainda está pairando, com os olhos baixos, percebe o movimento e o som de suas asas fica mais agudo, elevando-o um pouco. Os soldados recuam, amedrontados. O oficial volta pela rampa, olhando para dentro e apontando Anjack por várias vezes, de forma servil. Soldados espalhados na clareira, abrem um corredor entre a rampa e Anjack.
42
Plano desde os pés com sapatos macios, pernas com túnica fina. Tronco vestido de tecido fino, negro, brilhante, enfeitado com fios e peças de ouro. Rosto de daemon velho,  gordo, imponente, arrogante e cínico, não tem asas. Plano do daemon cercado por quatro enormes guardas vestindo armaduras negras, enfeitadas com detalhes de prata, segurando belas armas pesadas, com asas ornamentadas, retas e esporões brilhando. Atrás deles, alguns daemons  também velhos e sem asas, mas com roupas e atitude menos imponente. Quatro fêmeas daemons logo em seguida, esguias e sensuais, usando trajes curtos e reveladores, também sem asas. Se aproximam de Anjack. A comitiva fica para trás. O líder se adianta, ainda cercado dos três guardas. Os dois na frente, dão um passo para o lado e o líder dá um passo para frente. Mede Anjack de alto a baixo, com olhar de desprezo. Sua voz é poderosa e imponente.
LÍDER
Você mente, passarinho.
Anjack ergue os olhos, já foi chamado assim, antes. Suas asas vibram com tom mais grave e ele baixa até o solo. Os guardas ficam alertados, mantendo as armas mais firmes. Nas árvores, os anjos se posicionam, inquietos. As fêmeas daemons observam Anjack, com curiosidade, trocando observações e risinhos baixos entre si. O líder continua.
LÍDER
Pede paz por estar em desvantagem, Eloín?
Naquele tom de voz, "eloín" soou como um insulto. Anjack olha sem medo ou arrogância.
ANJACK
Nossas forças são semelhantes. Só desejamos acabar com morte e destruição.
O líder não se importa. Fala devagar, escolhendo palavras que soam sibilantes.
LÍDER
Sou um velho, passarinho. Há muito tempo tirei minhas asas para governar. Voar é para operários e soldados, não é trabalho superior. Desde então, vi meu povo sofrer fome e necessidades, enquanto outras raças desfrutavam das riquezas de nosso mundo.
Anjack ouve sem acreditar.
ANJACK
Sou Anjack, dos últimos anjos.Vamos compartilhar esse mundo e deixar o ódio queimar no outro.
O líder não se impressiona. Os velhos riem lá atrás. As fêmeas permanecem rindo baixinho e trocando impressões evidentemente sexuais sobre Anjack. O líder fala com gestos largos, inflamando-se a media em que fala.
LÍDER
Por milênios, ficamos condenados a viver em buracos escuros e úmidos, enquanto vocês viviam nos vales ensolarados. Não, Anjack. (irado) Todo esse mundo será nosso, (gesto amplo) depois que o último anjo e o último homem estiverem mortos (sibilante, cuspindo, quase tocando o rosto de Anjack). Então haverá paz. (controlado e divertido) Nós ficaremos em paz.
Encaram-se, rostos bem próximos. O rosto crispado pelo ódio do líder, a imobilidade e calma de Anjack.
43
Ao fundo, movimento furtivo de soldados, posicionando-se e procurando nas árvores. Alguns soldados mais longe levantam as armas, mas o líder está muito perto de Anjack. O líder dá as costas e se afasta, com o mesmo andar imponente. Tensão. Os guardas de honra, dão um passo para o lado, fechando a retaguarda do líder, andando para trás, sem deixar de fitar Anjack com olhar atento e ameaçador. As armas estão cruzadas sobre o peito. As fêmeas e os outros velhos andam apressados para a rampa.  Anjack nota o sutil movimento de um dos guardas, apertando a arma. Soldados em torno se movimentam rápido. Apontam as armas para Anjack. Os guardas apontam suas armas.
Anjack salta, voando para cima e pára trás, com os punhos já armados e atirando. Das árvores, muitos disparos. Um guarda de honra é atingido e cai, expondo o líder.. O outro atira em Anjack, sem acertar. Soldados fecham novamente a retaguarda do líder, que agora corre para a rampa. Anjos atacam das árvores, daemons são atingidos, outros procuram abrigo nas caixas e máquinas espalhadas na clareira. Anjos atiram. Anjack foge para as árvores, sempre atirando com pontaria certeira. Uma anja o recebe, cobrindo sua retirada. Daemons municiam e apontam a bateria pesada para as árvores. Atiram com o grande poder de fogo dos quatro canos, arrancando grandes pedaços de árvore e galhos inteiros. Anjack e os anjos recuam rente às copas das árvores, sumindo na noite escura. Daemons se reúnem para persegui-los, liderados pelo oficial. O líder sai pela rampa, certificando-se com olhares esquivos de que não há mais perigo.
LÍDER
Deixe que vão. Os últimos anjos morrerão amanhã.
44
O dia clareia. O sol ainda não surgiu no céu, mas a atmosfera tem tons prateados e dourados, ainda sombria sob as árvores da mata densa. Um grupo de três anjos, se move em silêncio pelo chão. As asas bem recolhidas e os movimentos lentos, andando com cuidado para a clareira. Os vigias daemons olham detidamente para o céu em torno. Sob arbustos espessos, os três observam os daemons.
Sob a nave, uma oficina improvisada com daemons trabalhando na preparação de dois tanques voadores. Veículos terrestres, caixas de munição e galões de combustível espalhados em volta, sem nenhuma organização. Um daemon abastece o tanque voador com óleo dos galões. Está relaxado. Olha as baterias agora espalhadas nos quatro lados da nave. Daemons pousam. Uma fêmea desce da rampa, seminua e provocante. Um deles lhe estende animais mortos, pendurados por cordas. São coelhos e aves. A fêmea recebe os animais e volta para a nave, sob olhares de cobiça e observações evidentemente eróticas dos daemons, rebola ainda mais e ri baixo. Eles riem e praguejam. Do outro lado, um grande grupo de soldados se preparando para lutar. Pegam armas, munição farta, verificam equipamentos. Anjack aponta os tanques voadores.
ANJACK
Temos que eliminar essa vantagem deles.
Tira da bolsa um grosso disco de metal. ajusta um botão no centro. A anja ao seu lado.
ANJA
É a única.
ANJACK
Vamos usar bem.
Anjack agarra o disco, fecha os olhos e murmura alguma coisa. Respira fundo e salta para cima. Voa rápido, chegando acima das árvores e, no mesmo movimento, arremete na direção dos tanques. As asas batem depressa, se encolhem para trás, como o mergulho do falcão, arrancando folhas das últimas árvores antes do início da clareira. A anja apreensiva, observa. Um radar daemon o capta. Apenas um "bip". O operador abre a boca para dar o alarme, mas o vôo é muito rápido. Anjack mergulha aturdindo o vigia e o daemon que abastece o tanque, corrige o curso com movimento sutil das asas, crava o disco na parede do tanque voador, sem parar, escapando pelo outro lado da nave, por entre as estruturas. O daemon que abastecia agarra o disco. Puxa com as duas mãos. Apóia os pés na parede e puxa com mais força. Nada acontece. Ainda pendurado, ouve um estalo e se apavora. A bomba explode, espalhando destruição. Destrói ambos os tanques, parte da nave acima deles, caixas de munição e galões de combustível em volta. O fogo se espalha, atingindo outros galões. Daemons são atingidos, arremessados longe, derrubados. A nave aderna, com a estrutura avariada, esmagando outros veículos e muitos soldados.
45
O oficial grita ordens em meio ao fogo. Localiza os três anjos se reunindo no céu e voando para cima. Os outros anjos saem das nuvens e se reúnem a eles. Anjack paira no ar, formam um grande círculo em sua volta, rodeando. Anjack brande o punho, aponta para a nave e grita.
ANJACK
A mim, Eloíns.
Do círculo, entram em formação em "V", apontando para a nave, com Anjack na ponta, as armas nos punhos sendo preparadas. O oficial aponta e grita ordens. Os daemons se movimentam. Decolam dispersos.  O oficial decola e grita ordens. Entram numa formação de amplo leque, com espaços e altitudes irregulares entre eles. São cinqüenta daemons. Já atiram, sem estabilidade e quase a esmo, precisando usar ambas as mãos para segurar as armas pesadas e bater as asas para subir. O oficial berra, eles param de atirar e procuram corrigir a formação. Os anjos descem em formação perfeita, com as asas recolhidas como águias mergulhando, silenciosos e quase sem sentir a força do vento. Aproximam-se. A um sinal de Anjack, abrem as asas, entrando em formação reta. Atiram juntos, bem estabilizados na corrente de ar, com muitas baixas entre os daemons. Os daemons atiram sem sair de formação. Somente um anjo é atingido e cai. Todos atiram à vontade. Chegando quase à mesma altitude, os anjos corrigem o vôo, entram em formação de "V" e sobem, passando por eles e indo para cima. Os daemons têm mais dificuldade em seguir o vôo dos anjos, tendo que fazer uma longa curva para seguir os anjos. Quando se posicionam, os anjos já ganharam altitude. Sobem com rapidez. Distantes dos daemons, Anjack avalia os seus anjos. Dá sinais e a formação em "V" se estreita, subindo ainda mais alto. Os daemons atiram, sem precisão.
No solo, alguns daemons decolam para se juntar aos outros. São violentamente instigados por um guarda da honra.  É como uma escalada. As asas batem com força para subir metro por metro, com material bélico pesado. Lá no alto, os daemons se agrupam sem formação, apenas se juntando. São ferozes, mas indisciplinados, perseguindo os anjos para cima. Atingindo grande altitude, Anjack sinaliza. A formação em "V" apontando para o céu, revoluciona e aponta para o solo, de forma suave e direta, abre-se em "U", com as asas recolhidas e mergulhando novamente. Os daemons pairam no ar, abrindo as grandes asas e apontando as armas. O "U" se abre num amplo leque e os anjos atiram ao mesmo tempo, com ambos os punhos. Os daemons são alvo fácil e parado, mas também acertam seus tiros. Muitos daemons são atingidos e caem. Cinco anjos são derrubados. Próximos dos daemons, Anjack gesticula e grita. Saca a espada, abre as asas e estica as pernas para frente. De suas botas, projetam-se lâminas de dez polegadas, travando no calcanhar. Anjack voa direto para o peito do daemon, quase atingido por seus tiros, que chegam a perfurar suas asas, mas enfiando as lâminas nele, soltando-as e procurando outro com a espada. Anjos também mergulham com as lâminas armadas, alguns ainda atirando com suas armas, outros, brandido espadas no ar. Um anjo e um daemon caem agarrados e lutando. Um anjo é atingido pelo fogo cruzado de dois daemons. Anjack corta um com sua espada, enquanto atira com seu punho em outro. Um deles, fica sem munição, atira o rifle em Anjack, ele se desvia. Arma os esporões das asas e ataca Anjack. Ele se esquiva e corta uma das asas do daemon, que cai enrolado na outra asa. Tiros de baterias do solo, atiram sob as ordens do guarda de honra. Atingindo dois anjos e até um daemon. Anjack avalia suas forças. Apenas o oficial e quatro daemons estão no ar, mas fugindo do fogo de suas próprias baterias. Outro anjo é ferido, mas permanece voando. Dá sinal e se retiram, mergulhando para longe. Atrás deles, um grupo numeroso de daemons. Na frente, dois guardas daemons, determinados e disciplinados. A formação deles é precisa, formando um leque. Anjack olha para trás, o leque se torna um "V". Anjack murmura.
ANJACK
Aprendem rápido.
Os daemons não atiram. Carregam armas leves e voam em silêncio. Estão descansados, enquanto todos os anjos estão exaustos e com feridos que diminuem a velocidade do grupo. Os anjos sobem. Voam para cima, escalando o ar com muito esforço. Os daemons seguem atrás. Os anjos continuam subindo. Um daemon está arfando e desiste. O guarda de honra rosna, mas continua subindo. Os anjos, cada vez mais cansados, já voam em formação irregular, mas continuam subindo, os anjos feridos ajudados pelos outros. Daemons exaustos desistem, deixando-se planar para o solo, procurando ar. Anjack grita para estimular os anjos. O ar é rarefeito, a respiração é difícil, a visão turva. Os daemons sofrem mais com a altitude. Tossem e apertam o peito e a garganta, aspirando o ar com força, repetidas vezes, até desistir e voltar para baixo. Mesmo o forte e disciplinado guarda de honra já sente os efeitos. Olha em trono. Já estão em menor número do que os anjos. Para. Abrem as asas e descem planando em largos círculos, como abutres. Os anjos param a subida, exaustos e aliviados,planando para longe.
46
Anjack e onze (?) anjos, pousam na frente da nave. Todos estão esperando. As construções estão paradas. As crianças estão reunidas em grupos silenciosos, espalhados em volta. Os homens trabalham na oficina, transformando lâminas de metal retiradas da nave em espadas e lanças compridas. Uma porção delas já está amontoada na mesa de carpinteiro, antes usada para construir janelas e portas para as casas. Mary corre para ele. Abraçam-se. Ela se comove com os diversos ferimentos nele. Nos braços, na asa, no rosto, Afaga seu rosto cansado. Davi e outros ajudam os anjos feridos, levando-os para dentro da grande tenda, onde já tinham preparado camas e material cirúrgico. As crianças ficam à distância, impressionadas com a aparência selvagem e ensangüentada de todos. Anjack responde ao olhar inquiridor de Mary.
ANJACK
Não pudemos evitar, eles não querem nenhuma paz.
Ela o afaga. Tenta levá-lo para a enfermaria.
MARY
Venha tratar seus ferimentos.
Ele resiste. Fica parado. Aceita uma jarra de água que trazem para ele. Os outros anjos também recebem água e comida ali mesmo. O jovem anjo sai da nave, seguido por Davi. Cada um traz uma caixa.
DAVI
Essa é toda a munição que encontrei.
ANJACK
Distribua igualmente.
Recebe sua parte, municia apenas um dos punhos com as cargas que recebe. Tira o outro punho e larga no chão. Os anjos feridos saem da enfermaria, sob protesto das pessoas que cuidam deles. Recebem sua parte da munição e não voltam para a enfermaria. As pessoas e Mary começam a perceber a intenção de Anjack.
MARY
Não podem voltar lá. Vocês estão feridos e cansados.
Ele relaxa um pouco. Compreensivo, abraça-a, segura-a pelos ombros com leveza, olha bem para ela.
ANJACK
Precisamos, Mary. Todas as outras escolhas serão arriscadas para vocês.
Davi, ao lado deles, insiste, aponta para as espadas e lanças sobre a mesa.
DAVI
Podemos enfrenta-los juntos. Somos muitos.
ANJACK
Eles são guerreiros ferozes e impiedosos. Estão bem armados. Vocês são colonos com muitas crianças para cuidar.
Mary interfere, desesperada.
MARY
Vamos fugir, então. Vamos nos esconder nesse grande planeta. Se nos encontrarem, estaremos mais fortes e preparados.
Anjack apenas sacode a cabeça. Ergue os braços, fazendo calar os murmúrios e os pedidos que todos fazem ao mesmo tempo.
ANJACK
Temos que ir ao encontro deles. Enfrentar os daemons antes que eles nos encontrem. Mas vocês na podem esperar por nós.
Olhares de susto e negativas de todos.
ANJACK
Abandonem esse lugar. Usem a nave, está avariada, mas ainda pode levar todos para bem longe. Procurem vales protegidos e evitem campos abertos.
Anjack aproxima Davi e Mary, pondo-os em sua frente.
ANJACK
Liderem seu povo. Viemos aqui para protege-los. Assim será! Podemos vencer, só atrasa-los ou mesmo ser derrotados. Pois são muitos e bem armados. Mas vocês sempre terão mais tempo. Enquanto houver um anjo vivo, vocês estarão a salvo.
Mary está paralisada e sem reação. Anjack percebe o olhar decidido de Davi.
ANJACK
Vão. Esse mundo é de vocês.
Mary salta e envolve seu pescoço num abraço apertado. Anjack a afasta, devagar. Anjack vai se afastado, de costas, olhando para Mary. Querendo ficar, precisando partir. Chora. Volta-se e voa com os outros anjos. Os colonos olham. Mary corre acompanhando o vôo ater chegar na borda da floresta. Anjack paira no ar e se volta. Empunha a espada, mostrando-a aos colonos, com gesto confiante. Todos os anjos imitam seu gesto. Plano dos anjos pairando no ar, rostos decididos e expressões de sacrifício. As asas batendo lenta e majestosamente. Os colonos gritam e acenam, comovidos. Anjack retoma o vôo e grita.
ANJACK
A mim, Eloíns!
Batendo as asas. As asas se movem lentas e fortes, empurrando o ar, os músculos retesados nas costas. As asas rufando em conjunto, batendo quase juntas. O jovem anjo. Algumas anjas. Anjos feridos sem se importar com os ferimentos. Crianças acenando. A menina com os gatinhos nos braços. Os colonos diminuindo à distância. Os anjos ficando cada vez menores no céu, até desaparecerem por completo. Mary, se volta para os colonos, aponta a nave.
MARY
Vamos fazer como Anjack mandou. Mexam-se!
Olha de novo para o ponto onde os anjos sumiram e anda decidida para a nave. Davi e os outros movem-se, decididos, dando ordens.
Corte. Som metálico. Asas batendo, choque de espadas. Rajadas. Vultos negros e brancos no céu vermelho. Luz branca. Raios e trovões ao longe. Luz forte e trovões bem perto. Vulto negro. Vertigem, caindo no solo bem distante. Asa de anjo batendo furiosa. Anjack e um guarda de honra daemon cruzam espadas no ar. Anjos ao fundo, lutando. Anjack e o daemon engalfinhados no ar, com as espadas levantadas.
Congela a imagem. Torna-se gráfica. Torna-se pintura enchendo os traços com tintas grossas, com aspecto medieval. Sobreposição de imagens religiosas, do islamismo e do hinduismo e do cristianismo, quadros e afrescos famosos de anjos lutando contra demônios. até o
FIM.
SINOPSE
Há 135.000 anos, anjos e homens convivem em harmonia, entre si e com a natureza, tendo como inimigos os daemons, no planeta Marte. Enquanto isso a Terra é atingida por meteoros e toda a vida superior é dizimada. A guerra com os daemons destrói Marte e um grupo de humanos ajudados por anjos foge para a Terra, onde a batalha continua. Anjack é o anjo central da estória, tem um romance com a humana Mary e se destaca na luta contra os daemons, liderando o grupo de anjos que vêm para a Terra como protetores dos humanos.
DESCRIÇÃO DE PERSONAGENS
ANJOS
Anjos são quase homens com asas, com diferenças devidas à adaptação para voar, como o peito mais largo, a silhueta fina, altos e magros, com traços faciais agudos. São maiores, mas mais leves que os humanos, pois devem possuir ossatura oca. Têm músculos longos e fortes, com cartilagens grossas. Suas asas não são guarnecidas com penas, pois não evoluíram de aves. São asas com o formato de asas de águias, mas revestidas de pele e cobertas com pelos finos e leves, que, em geral, acompanham a cor da pele e dos cabelos. Longos e fortes músculos se cruzam entre as asas e descem pelas costas, acompanhando a anatomia das asas.
Anjos são uma raça mais velha do que os homens, mantendo uma relação quase paternal.
Machos e fêmeas têm os mesmos papéis, exercendo sem exceção as mesmas atividades, especialmente entre os soldados, sempre em igual proporção.
Constroem suas casas na parede das escarpas e das montanhas, escavadas na rocha, com sacadas bem decoradas. Também habitam nos troncos das grandes árvores, construindo moradas entre os galhos. Cultivam alimentos em grandes nuvens escoradas no céu, domesticam grandes rebanhos de pássaros.
Sua tecnologia é avançada e sofisticada, mas minimalista e simples, sempre com design natural. Dominam a ciência dos gases e das energias naturais, como a solar e a eólica. Seus veículos são simples, leves e silenciosos, feitos de fibras trançadas, tecidos e outros materiais de aparência orgânica, carregados por balões, colchões de gás e alimentados por painéis solares onde a luz parece mergulhar, de tão negros e eficientes.
Usam roupas claras, como saiotes, túnicas ou calças. Coletes apenas na frente, amarrados na cintura, deixando as asas livres. Feitas de tecidos naturais, como seda e algodão. Usam sandálias ou botas longas. Usam muitos enfeites, seja nas asas, nos cabelos trançados finamente para que não atrapalhem o vôo, nos braços e no pescoço. São delicados enfeites, feitos de madeira entalhada, pedras semipreciosas, penas e conchas. Os anjos usam faixas de couro trançado na cabeça, os mais jovens usam brincos compridos. Mesmos os soldados usam enfeites.
Os soldados são como monges e os quartéis como mosteiros. A arma principal é vestida ao longo dos braços, projetando-se nos punhos sobre as costas das mãos, por necessidade aerodinâmica, acionadas por uma meia luva, sendo dardos impulsionados por gases. Usam armas maiores, metralhadoras com o mesmo princípio, usadas por homens e por anjos. Usam uma espada longa, de finalidade mais cerimonial, mas usada em batalha. Nas botas, podem acionar lâminas retráteis que se projetam, travam no calcanhar e são usadas em mergulhos fatais para os inimigos.
O vôo dos anjos imita o vôo de todos os pássaros. Atacam como águias, pairam como colibris, planam como andorinhas. Voam rápido e com grande agilidade.
As mulheres são bonitas e desejáveis, usando roupas curtas e muitos enfeites.
São harmônicos com a natureza, limpos, vegetarianos e ecologicamente perfeitos. Deve ser enfatizado sempre que compõe com os homens uma sociedade ecologicamente equilibrada, em convivência ideal com o meio em que vivem.
HOMENS
Homens normais. São menores do que os anjos. Vivem em casas bem espalhadas e do tipo mediterrâneo, sempre integradas ao ambiente ao redor, junto das casas dos anjos. Pilotam veículos aéreos e terrestres, cavalgam pássaros, são maioria nas atividades tecnológicas, formando com os anjos uma só sociedade.
São mais ágeis e rápidos que os anjos, quando no solo. Por isso, portam armas mais pesadas e pilotam pequenos veículos de passeio ou militares, que não são dimensionados para as asas dos anjos.
Usam roupas feitas de forma semelhante e com os mesmos materiais que os anjos.
DAEMONS
Com formas humanóides, mas com traços faciais, formas corporais e pele semelhante aos répteis. Têm asas coloridas do marrom ao negro, com esporões nas extremidades e cauda longa.
Vivem em territórios isolados, nas grandes cordilheiras de montanhas, em cavernas grandes. Usam roupas de couro, com detalhes em metais que revelam posição social ou posto militar. São carnívoros predadores com atividades de extrativismo. Seus veículos são metálicos, escuros, ruidosos e produzem muita fumaça. A base de sua tecnologia é o combustível fóssil, suas armas são de pólvora.
As classes dirigentes arrancam as asas. As fêmeas não têm asas, tendo apenas função de reprodução, trabalhos menores e diversão. As diferenças sexuais são grandes. Os daemons têm as pernas curtas, o tronco grosso e braços longos. As fêmeas são altas e esguias, com quadris largos e peitos grandes.
Os guerreiros usam meia armadura, no peito e na parte frontal das coxas, feita de tiras de metal ou borracha negra. Usam apenas um calção curto e sandálias de borracha. Os oficiais e guardas de honra usam botas longas e armaduras completas. São agressivos e ferozes, sem muita disciplina, conduzidos pelo terror.
Usam armas pesadas, como rifles e metralhadoras com balas de chumbo e munição de pólvora, que empunham com as duas mãos.
São lentos para voar, sendo mais planadores.
São o oposto dos anjos. Usam metais e derivados de petróleo. Onipresente a fumaça dos motores a explosão e a oxidação do metal bruto. São agressores da natureza, predadores e poluidores. Muito semelhantes à nossa sociedade industrial.
MARTE
Como seria Marte a 135.000 anos, antes de uma guerra nuclear. Rios e oceanos enormes, grandes cadeias de montanhas, vales e canyons profundos. O horizonte é mais largo. Grandes planícies, florestas com enormes árvores. Ar mais tênue, com ventos quentes e calmos.
GEA
A Terra, pouco depois de ser atingida por grandes asteróides que dizimaram a vida superior e extinguiram o homem de neanderthal. O planeta está se recuperando, cerca de vinte anos depois da colisão de meteoros que dizimou toda a vida superior.


PROVISÓRIOS
1 - nome de Mary.
2 - número de anjos na Terra.
3 - número final de anjos.
4 - asas de pena ou de pele.
5 - uma só batalha final.